Ontem (05/11) foi dia de prova e o tema da redação do ENEM 2023 foi “Desafios Para O Enfrentamento Da Invisibilidade Do Trabalho De Cuidado Realizado Pela Mulher No Brasil”. Vamos abordar quais pontos levantar como causa dessa invisibilidade e como podemos promover a valorização do trabalho de cuidado realizado pelas mulheres brasileiras.
O trabalho de cuidado é uma atividade essencial para o bem-estar social e econômico, mas que ainda sofre com a invisibilidade e a desvalorização. Ele envolve tanto o cuidado não remunerado com os familiares, especialmente crianças e idosos, quanto o cuidado remunerado em setores como saúde, educação e assistência social. Ambos os tipos de trabalho enfrentam desafios para serem reconhecidos e valorizados, tanto pela sociedade quanto pelo mercado de trabalho.
Um dos principais fatores que contribuem para esta invisibilidade é a divisão sexual do trabalho, condicionado socialmente, onde atribui às mulheres a responsabilidade pelo cuidado e pelo trabalho doméstico, enquanto os homens se dedicam ao trabalho produtivo e remunerado. Essa divisão é sustentada por normas de gênero que naturalizam o papel das mulheres como cuidadoras e desconsideram o valor econômico e social do seu trabalho.
Além disso, a falta de políticas públicas que apoiem as mulheres cuidadoras, como a oferta de creches, escolas em tempo integral, licença-maternidade e paternidade, e a proteção social para os trabalhadores de cuidado, dificulta a conciliação entre o trabalho e a família e aumenta a carga de trabalho das mulheres.
O impacto dessa situação é negativo tanto para as mulheres quanto para a sociedade. As mulheres que realizam o trabalho de cuidado não remunerado têm menos oportunidades de ingressar no mercado de trabalho, de ter uma renda própria e de se qualificar profissionalmente. As mulheres que realizam o trabalho de cuidado remunerado, comumente enfrentam condições precárias de trabalho, com baixos salários, jornadas extensas e falta de reconhecimento. Em ambos os casos, as mulheres sofrem com o estresse, a sobrecarga, a falta de autonomia e a discriminação. A sociedade, por sua vez, perde com o desperdício do potencial produtivo e criativo das mulheres, com a reprodução das desigualdades de gênero e com a diminuição da qualidade de vida da população.
Para enfrentar esse problema, é preciso que haja uma mudança cultural, política e econômica que valorize e visibilize o trabalho de cuidado. Essa mudança envolve a participação de diversos atores, como a sociedade, as políticas públicas, as empresas e a estrutura familiar.
A sociedade deve reconhecer o trabalho de cuidado como uma atividade fundamental para o desenvolvimento humano e social, e não como uma obrigação natural das mulheres. As políticas públicas devem investir em infraestrutura e serviços públicos de qualidade que atendam às necessidades das mulheres cuidadoras, como a educação infantil, a saúde, a assistência social e a previdência. As empresas devem adotar práticas de gestão que promovam a igualdade de gênero e a flexibilidade no trabalho, como a redução da jornada, o trabalho remoto, a igualdade salarial, auxílio creche, benefícios que promovam a saúde física e mental e a valorização do trabalho de cuidado. A estrutura familiar deve incentivar a participação dos homens nas tarefas domésticas e de cuidado, e a divisão equitativa das responsabilidades entre os casais.
Essas medidas podem contribuir para que o trabalho de cuidado realizado pelas mulheres no Brasil seja mais visível, valorizado e equitativo, e para que as mulheres tenham mais oportunidades de realização pessoal e profissional.
Um livro que aborda esse tema com profundidade e rigor é “Career and Family: Women’s Century-Long Journey toward Equity” de Claudia Goldin, premiada com o Nobel de Economia 2023, que traça a trajetória das mulheres com formação universitária nos Estados Unidos desde o início do século XX até os dias atuais, analisando as aspirações, os obstáculos e as conquistas em relação à carreira, ao trabalho, ao casamento e aos filhos. O livro mostra como muitas profissões são “gananciosas”, pagando desproporcionalmente mais por longas horas e trabalho nos fins de semana, e como isso perpetua as disparidades entre homens e mulheres. O livro também demonstra como a era da COVID-19 prejudicou severamente o avanço das mulheres, mas como o crescimento do trabalho remoto e flexível pode ser o lado positivo da pandemia. O livro explica por que é necessário fazer mudanças fundamentais na forma como trabalhamos e como valorizamos o cuidado, se quisermos alcançar a igualdade de gênero e a equidade entre os casais.
Essas são referências e soluções que podemos construir juntos, para uma sociedade e um ambiente de trabalho mais justo e equalitário!