Reflexão sobre a Rio+20

Na última sexta-feira, dia 22 de junho, encerrou a Conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. Foram abordados dois temas principais: a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza; e a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável. O documento final foi intitulado “O Futuro que Queremos” e, segundo grande parte da sociedade civil, deixou a desejar, depois de tantas expectativas.

Para entendermos um pouco mais sobre qual o verdadeiro posicionamento das empresas frente ao desenvolvimento sustentável, entrevistamos o Consultor-Membro do Comitê Central do Fórum Global de Juventude das Nações Unidas, Richarlls Martins. Ele é psicólogo formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e acompanhou de perto todos os detalhes da Rio+20.

MSARH: Houve aumento no número de empresas que apóiam de forma concreta o desenvolvimento sustentável?

Richarlls: É possível perceber que, de maneira geral, inclusive nos países em desenvolvimento, há uma preocupação com ações para o desenvolvimento sustentável, pautadas na perspectiva da economia verde. No entanto, ainda que se possa notar esta preocupação em âmbito empresarial, as ações com base na sustentabilidade, atuando na diminuição dos impactos da produção sobre o meio ambiente, ainda são irrisórias. Infelizmente, tem-se ainda a percepção de que o meio ambiente é um adversário para os meios de produção e para o desenvolvimento. Então, consigo notar, de modo geral, que as empresas têm uma preocupação com o tema, mas não posso afirmar que todas elas possuem ações concretas em relação ao desenvolvimento sustentável.

MSA: Em comparação com a Rio 92, houve algum progresso no âmbito empresarial?

Richarlls: Sim. Talvez na Rio+20 a maior surpresa tenha sido a participação ativa do segmento empresarial nas discussões e proposições de ações para além dos protocolos da conferência. O segmento empresarial na conferência atual estabeleceu metas e se comprometeu diretamente com pontos tratados. A questão que deve ser considerada é até que ponto este progresso conseguirá incidir diretamente nos impactos ambientais históricos de outras perspectivas de desenvolvimento.

MSA: Quais são as metas para os próximos anos?

Richarlls: Os países membros da ONU têm até 2015 para apresentarem as metas, mas o ponto principal de onde devem convergir as propostas é articular como a perspectiva de desenvolvimento sustentável se relaciona com o enfrentamento global da pobreza.

MSA: Qual foi a principal divergência entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento na Rio+20?

Richarlls: Tiveram muitos pontos polêmicos desde o início das rodadas de negociação, passando pelo nível da diminuição de gás carbônico, até a manutenção ou não do termo em referência aos direitos sexuais e reprodutivos e direitos humanos. Contudo, um dos pontos de maior destaque é o que se refere ao fortalecimento e status do PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em especial na participação financeira dos países para o fortalecimento do Programa.

MSA: Foi graças à intervenção da ONU e a criação da primeira conferência, a Rio 92, que as empresas começaram a se interessar pelos assuntos socioambientais?

Richarlls: Pode-se dizer que foi graças à Rio 92 (ou seja, à participação dos Estados membros, da sociedade civil, especialistas, da classe artística, entre outros) que as empresas e a sociedade passou a olhar para o meio ambiente como uma questão relevante. A Rio 92 trouxe um novo paradigma para esta discussão, que até então ficava relegada à participação exclusiva de especialistas. Há 20 anos atrás, foi introduzida na agenda global a concepção de desenvolvimento sustentável e sustentabilidade. O que hoje pode parecer politicamente correto e senso comum é uma vitória do movimento social articulado, que há décadas vem denunciando as formas de exploração do meio ambiente e apontando que as tradicionais perspectivas de desenvolvimento levariam o mundo a um colapso. E neste sentido, as empresas, como parte da sociedade, não teriam como ficar alheias a este processo.

MSA: O saldo da conferência foi positivo ou negativo?

Richarlls: É dificil fazer uma análise tão fechada sobre a Rio+20 enquanto positiva e negativa por 2 motivos especiais. O primeiro é que analisar o tempo presente é um desafio, porque hoje não se é possível dar conta da complexidade de tudo que esta inserido na articulação de uma agenda global, como a agenda do desenvolvimento sustentável. E segundo é que existem ganhos e perdas que não são possíveis de se medir com a ratificação ou não de um documento final. Pessoalmente eu compartilho da posição da maior parte do movimento social de apontar que o resultado final (pensando especificamente em relação ao documento aprovado) deixou a desejar, em especial ao se pensar o legado histórico da Rio 92, e acima de tudo por não pautar pontos relevantes na temáticas dos direitos humanos, já coscensuados em outras conferências das Nações Unidas, como o tema dos direitos reprodutivos. Contudo, existe um ganho que não é possível medir em uma declaração, como por exemplo, o fato de que a população carioca e de turistas ficaram horas na fila para assistir à exposição sobre sustentabilidade, as discussões sobre temas tão diversos na Cúpula dos Povos e a aproximação que esta agenda teve de pessoas que não se propõem normalmente a discutir estes temas. Tudo isso é parte do processo de revisão da Rio+20 e não pode ser entendido como um fenômeno à parte e não analisado. Por este motivo, é complexo avaliar neste momento o saldo. Acredito que é importante analisar a década de 1990 com mais cuidado, quando ocorreu a Rio 92, a Conferência de Viena em 93, a Conferência de Cairo em 95, entre outros, e pensar o que fez com que, naquele contexto, conseguíssemos construir novos paradigmas, introduzindo temas como desenvolvimento sustentável na ordem do dia, e no fato de que hoje alguns países ainda anistiam desmatadores, por exemplo. Acho que a chave para avaliarmos a Rio+20 é aprofundar a discussão sobre de onde vem essa discussão toda, para só assim pensarmos no que desejamos para a construção de um mundo melhor.

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